"A regra da igualdade não consiste senão em quinhoar desigualmente aos desiguais, na medida em que se desigualam. Nesta desigualdade social, proporcionada à desigualdade natural, é que se acha a verdadeira lei da igualdade... Tratar com desigualdade a iguais, ou a desiguais com igualdade, seria desigualdade flagrante, e não igualdade real." Rui Barbosa



domingo, 29 de abril de 2012

REFORMA DO CÓDIGO PENAL: FURTO DEPENDERÁ DE REPRESENTAÇÃO

29 de abril de 2012, às 10h08min

Novo Código Penal: processo por furto dependerá de representação da vítima


A comissão de juristas que elabora o anteprojeto do novo Código Penal aprovou proposta que condiciona à representação da vítima a ação penal por furto, que não mais será ação pública incondicionada, como atualmente. A mudança significa que o criminoso somente será processado no caso de a vítima representar perante a autoridade policial. A pena foi reduzida para seis meses a três anos, para possibilitar a suspensão condicional do processo no caso de réus primários. Atualmente, a pena prevista é de um a quatro anos.

Dados do Departamento Penitenciário Nacional, do Ministério da Justiça, revelam que há no país 65 mil pessoas presas por furto. A ideia da comissão é promover uma “descarceirização”. O presidente da comissão, ministro Gilson Dipp, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), classificou de degradante a situação carcerária no Brasil. “A comissão diminuiu a ofensividade do crime de furto, mas não desconsiderou furtos que podem ter gravidade, como o furto com uso de explosivos”, explicou o ministro, que preside os trabalhos da comissão.

A defensora pública Juliana Belloque observou que a comissão de juristas tem como foco a repressão a crimes violentos: “Alguém tem que sair para colocarmos outro dentro [dos presídios].” Juliana esclareceu que as mudanças não foram tiradas “da cartola”. São uma construção que levou em conta, também, propostas encaminhadas pelo Ministério da Justiça à Câmara dos Deputados.

A proposta para o novo Código Penal considera para fins de furto a energia elétrica, água, gás, sinal de tevê a cabo e internet ou qualquer outro bem que tenha expressão econômica, além de documentos pessoais. Os juristas ainda mantiveram como causa de aumento de pena o furto praticado durante o repouso noturno e com destreza – que é a técnica desenvolvida para o crime.

Ainda quanto ao furto simples ou com aumento de pena, a comissão definiu que a reparação do dano, desde que a coisa furtada não seja pública ou de domínio público, extingue a punibilidade, desde que feita até a sentença de primeiro grau e aceita pelo réu.

Furto qualificado

A comissão considerou como qualificado o furto de veículos transportados para outro estado ou para o exterior, de bens públicos e aqueles cometidos em ocasião de incêndio, naufrágio e calamidade, os chamados saques. Nesses casos, a pena será de dois a oito anos. Quando houver uso de explosivos no furto, a pena será de quatro a oito anos.

O relator da comissão, procurador regional da República Luiz Carlos Gonçalves, comemorou a mudança aprovada pelos juristas. “É uma proposta moderna que redefine o crime de furto no Brasil”, afirmou.
Álcool a menor
A comissão aprovou proposta que endurece a repressão contra o fornecimento ou a venda de bebidas alcoólicas a crianças e adolescentes. Com isso, foi criminalizada a venda e o fornecimento a menores de 18 anos, ainda que gratuito, de drogas que possam causar dependência – inclusive bebidas alcoólicas.

De acordo com o relator da comissão, a tipificação é necessária em razão da revogação da lei de contravenções, que será proposta pela comissão.
Abuso de autoridade
Foi aprovada proposta que criminaliza diversas condutas praticadas por agentes públicos contra a chamada “administração da Justiça”. Os juristas tipificaram a submissão injustificada de presos e investigados ao uso de algemas, a revista íntima vexatória e humilhante em visitantes nos presídios, a invasão de casas e estabelecimentos sem autorização, violação de prerrogativas legais dos advogados e a obtenção de provas ilícitas.

Para o advogado e membro da comissão Marcelo Leal, trata-se de uma conquista para toda a sociedade. “O advogado atua nos processo em nome da sociedade e, quando tem violada uma garantia, na verdade está sendo violado o direito do cidadão, que através do trabalho do advogado não consegue exercer adequadamente a sua defesa”, ressaltou.

Além de novos tipos penais, a comissão definiu mais rigor para a punição do abuso de autoridade, que poderá variar de dois a cinco anos de prisão – contra seis meses na lei atual.
Remoção de órgãos
A remoção de órgãos ou tecidos passa a ter tipo próprio e não será mais punida como lesão corporal. A criminalização visa atingir quem vende, compra ou facilita a compra de órgãos e tecidos humanos.
Tráfico de pessoas
A legislação atual considera crime apenas o tráfico de pessoas para exploração sexual. A comissão de reforma do Código Penal tipificou também o tráfico com a finalidade de submeter a vítima a trabalho escravo e para remoção de órgãos. O tipo penal será aplicado tanto para tráfico internacional como entre os estados.

O anteprojeto do novo código vem sendo elaborado desde outubro e deve ser entregue ao Senado no dia 25 de maio, para tramitar como projeto de lei nas duas casas do Congresso Nacional.
 

Fonte: Superior Tribunal de Justiça
Autor: Coordenadoria de Editoria e Imprensa
Categoria: Direito Penal


Fonte: http://www.juristas.com.br/informacao/noticias/novo-codigo-penal-processo-por-furto-dependera-de-representacao-da-vitima/19560/

XXI ENCONTRO NACIONAL DO CONPEDI


XXI Encontro Nacional do CONPEDI - "Sistema jurídico e direitos fundamentais individuais e coletivos"



O XXI Encontro Nacional do CONPEDI, será realizado em Uberlândia – MG, nos dias 06, 07, 08 e 09 de junho de 2012, promovido pelo CONPEDI e pela Universidade Federal de Uberlândia – UFU, com apoio da CAPES e CNPq sobre o tema “ SISTEMA JURÍDICO E DIREITOS FUNDAMENTAIS INDIVIDUAIS E COLETIVOS”.


quarta-feira, 25 de abril de 2012

UMA TRISTE REALIDADE DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

*Ovídio Rocha Barros Sandoval



Algum tempo atrás no ano de 2009, publiquei um artigo no nosso querido Migalhas sob o título "Reflexões sobre o Supremo Tribunal Federal" e, diante da entrevista do ministro Joaquim Barbosa no "O Globo" do último dia 19 de abril e pelos termos por ele usados, entendo de real pertinência voltar a repisar alguns aspectos importantes sobre a convivência dos Ministros de nossa Suprema Corte.
Rui Barbosa, no início do século XX, dirigindo-se ao Supremo Tribunal Federal, em sustentação oral, deixou a imorredoura exortação:
"Quisesse eu levantar os escarcéus políticos e não me dirigiria ao remanso deste Tribunal a este recanto de paz" e "aqui não podem entrar as paixões que tumultuam na alma humana; porque este lugar é o refúgio da Justiça".
De outra parte é da tradição do Supremo o tratamento respeitoso, educado e cortês entre seus Ministros, durante os debates travados no Plenário e nas sessões de suas Turmas.1
Sugestivo lembrar que na Suprema Corte dos Estados Unidos da América, durante os debates, o tratamento utilizado por seus Ministros é o de "my Brother" e não "Vossa Excelência", simplesmente.

O espírito de educação, cortesia e generosidade reina em todas as Cortes Supremas de Justiça, por serem "recantos de paz" e "refúgio da Justiça".

Todavia, em passado recente, o ministro Joaquim Barbosa resolveu ser protagonista de fatos lamentáveis, quebrando essa antiga tradição. No dia 23 de abril de 2009, em idêntica atitude agora reiterada com o Presidente Cezar Peluso, "colocou em xeque a lisura do presidente da Corte à qual pertence, o fez também com relação à legitimidade das próprias decisões do tribunal. As acusações feitas por ele até hoje haviam sido contra seus pares de bancada, não contra a direção do tribunal" 2. Parece que atacar a "direção do Tribunal" não é nova para o referido ministro. Naquela oportunidade, chegou ao despropósito de se referir a "capangas mato-grossenses" comandados pelo ministro Gilmar Mendes e desafiou o Presidente a "sair às ruas" 3. Em duas outras ocasiões tomou atitudes surpreendentes. Em um julgamento acusou o Ministro Marco Aurélio "de fraudar distribuição de processos. Ainda neófito nos pormenores da Corte, só não foi punido porque o presidente à época, Nelson Jobim, pôs panos quentes no caso. Marco Aurélio não deixou barato. Entrou com representação na presidência e provou que não houve fraude, mas apenas a redistribuição de um processo cujo relator, Joaquim Barbosa, não estava em Brasília na sexta-feira à noite. Estabelecida a verdade, Marco Aurélio abriu mão da representação. Barbosa retratou-se" 4.

Em outro julgamento, o ministro Joaquim Barbosa, de forma descortês e injusta, acusou o ministro Eros Grau de defender a libertação de um réu, levando em conta a sua posição social. E estendeu sua descabida acusação aos demais ministros, insinuando que o Supremo Tribunal Federal julgava levando em conta a qualidade social das pessoas. Em suma, colocou em xeque a imparcialidade da Suprema Corte, obrigando o ministro Celso de Mello, como presidente da sessão, a ponderar, com toda a Justiça: "É preciso que fique claro que esta Suprema Corte não julga em função da qualidade das pessoas ou de sua condição econômica, política, social ou funcional".

O ministro Joaquim Barbosa – sempre ele – em debate travado a respeito de um determinado caso, acusou o ministro Gilmar Mendes de estar dando um "jeitinho" naquele julgamento.

Na entrevista ao jornal "O Globo" dirigiu seus ataques ao Presidente Ministro Cezar Peluso, eminente e consagrado Juiz de carreira em 44 anos de atividade ininterrupta, chegando ao despropósito, como já o fizera com o Presidente Ministro Gilmar Mendes, de colocar em xeque a sua atuação na presidência da Suprema Corte. Não parou aí. Desbragadamente atacou a pessoa do Ministro Peluso com termos que não se coadunam com a educação de berço, que é fundamental para o juiz. A boa educação ensina o juiz a portar-se com urbanidade, respeito e cordialidade, dentro e fora de seu local de trabalho.

Dias antes o Ministro Peluso, em entrevista ao Conjur, disse que o ministro Joaquim Barbosa era inseguro e "dono de temperamento difícil". O ministro Joaquim em tom duro, grosseiro, deseducado e sem qualquer estima pela verdade, atacou o Ministro Peluso dizendo tratar-se de um "brega", "ridículo", "caipira", "corporativo", "desleal", "tirano" e "pequeno", além de haver "manipulado" resultados de julgamentos de acordo com seus interesses.

Disse mais: "As pessoas guardarão a imagem de um presidente conservador e tirânico, que não hesitava em violar as normas, quando se tratava de impor à força a sua vontade" 5. Em determinado momento diz que ele e o Ministro Peluso pertencem a "mundos diferentes", bastando "comparar nossos currículos, percursos de vida pessoal e profissional", apostando que "Peluso nunca curtiu nem ouviu falar de The Ink Spots" (grupo norte-americano de rock e blues da década 1930/1940), "Isso aí já diz tudo do mundo que existe a nos separar". Posso afirmar, em sã consciência, que os Ministros vivem mundos diferentes. Não conheço o currículo do ministro Joaquim Barbosa, mas conheço o currículo e o percurso de "vida pessoal e profissional" do Ministro Peluso. Possui um vasto currículo de formação humanística e de sólida cultura jurídica e uma trajetória brilhante em 44 anos de Magistratura, galgando todos os degraus da carreira até chegar ao Supremo Tribunal Federal, sendo homem de educação de berço, cordial, gentil, atencioso e pode ser que não conheça o famoso grupo de rock da década de 1930/1940, mas conhece música erudita e popular. Em sua vida pessoal, de seu turno, conseguiu formar uma linda família e uma legião de amigos sinceros e leais, além de milhares de admiradores, eis porque o eminente Ministro Carlos Velloso disse ser muito difícil encontrar alguém que o substitua no Supremo Tribunal Federal. Em todos os cargos que exerceu, como Juiz e Professor, deixou a marca de sua inteligência privilegiada e o brilho de sua cultura humanística e jurídica. Não há dúvida, o Ministro Peluso pertence a um mundo, totalmente diferente do ministro Joaquim Barbosa. Sou Amigo do Ministro Peluso há 35 anos e posso dizer, em meus 50 anos dedicados de forma exclusiva ao Direito e a Justiça, que nunca presenciei qualquer ato de descortesia, de agressividade verbal, de insegurança, muito menos de indignidade capaz de levá-lo a praticar “manipulação” de resultados como alegado, olimpicamente e de forma leviana pelo ministro Joaquim. Aliás, o atual Presidente do Supremo ilustre Ministro Ayres Brito afirmou “ser logicamente impossível” a manipulação de resultados6.

Outra é a postura do Ministro Joaquim Barbosa. Desde sua chegada ao Supremo, criou desavenças contra vários Ministros da Corte Suprema, faltando ao respeito devido aos seus colegas e usando da grosseria e da falta de educação como armas para atacá-los.

No final da entrevista o ministro Joaquim Barbosa fala que sempre deu resposta na hora e dura, quando algum "engraçadinho" tomou certas liberdades, “achando que a cor da minha pele o autorizava a tanto”, mas "isso não me impediu de ter centenas de amigos nos quatro cantos do mundo". Retorna a preocupação sempre presente com o preconceito de cor7. Diz ter centenas de amigos nos quatro cantos do mundo, possivelmente escondidos nos quatro cantos do mundo...

Quando ataca o Ministro Peluso de "corporativista" porque sempre foi defensor da independência do Poder Judiciário e da Magistratura contra a atuação sem limites de um órgão administrativo e burocrático, qual seja o CNJ, o ministro Joaquim Barbosa se esquece que o inesquecível e notável Ministro Ribeiro da Costa, na presidência do Supremo, quando o Executivo, logo depois do Movimento Militar de 1964, procurava atingir o Poder Judiciário e a independência da Magistratura, de forma altiva deixou a seguinte lição para todos os Presidentes da Suprema Corte que o sucederam: “nosso poder de independência há de manter-se impermeável às injustiças do momento, e acima dos seus objetivos, quaisquer que se apresentem suas possibilidades de desafio às nossas resistências morais” e a Justiça “quaisquer que sejam as circunstâncias políticas, não toma partido não é a favor ou contra, não aplaude nem censura”8. Quem defende o Poder Judiciário e a Magistratura independentes, especialmente na Presidência do Supremo Tribunal Federal, defende o Estado Democrático de Direito.

Para o ministro Joaquim Barbosa: o magnífico e saudoso Ministro Ribeiro da Costa teria sido "corporativista"?

São fatos lamentáveis, porque os ministros e ministras do Pretório Excelso constituem-se em exemplos de Juízes e Juízas para toda a Magistratura. Há uma aura de respeito e veneração que cerca o Supremo Tribunal Federal neste país.

Bem por isso os fatos ora relatados não se circunscrevem ao âmbito do Supremo Tribunal Federal. Ganham repercussão nos demais órgãos jurisdicionais colegiados e em toda a Magistratura nacional.

É urgente que o Supremo Tribunal Federal seja o "recanto de paz", o "refúgio da Justiça", nas palavras de Rui Barbosa.

O meu saudoso e querido Amigo Ministro Domingos Franciulli Netto costumava dizer: "ser Juiz é o estado d’alma do homem vocacionado", enquanto outro saudoso e querido Amigo Desembargador Alves Braga dizia: "ser magistrado é estado de espírito”. Quem exerce a nobre missão de ser magistrado há de meditar sobre essa candente realidade. Somente os vocacionados estão aptos ao exercício de ser magistrado em todos os momentos de sua vida e conseguem entender em plenitude a advertência feita por Guizot: "Quando a política penetra no recinto dos tribunais a Justiça se retira por alguma porta." E pode-se acrescentar que a incontinência vocabular, quando agressiva, revela um tumulto íntimo de insegurança que espanca a serenidade necessária ao magistrado e o afasta por inteiro da sindérese, isto é, da capacidade espiritual, inata, imediata para apreender os primeiros princípios da Ética.

__________
1 Neste ano estou completando 50 anos de dedicação integral ao Direito e à Justiça e presenciei várias composições do Supremo Tribunal Federal e nunca tive notícia de qualquer tratamento descortês ou agressivo por parte de seus Ministros. Presenciei discussões acaloradas entre seus Juízes onde o respeito e a educação sempre estiveram presentes. Assisti em uma sessão, o gesto encantador do fantástico Ministro Victor Nunes Leal, que começava a elaborar as Súmulas de Jurisprudência Predominante do Supremo, citar um precedente e perguntar “é isso mesmo Ministro Hanhemann Guimarães”, que era considerado a melhor memória sobre a jurisprudência do Supremo. Bons tempos aqueles.

2 Artigo de Bartolomeu Rodrigues e Rodrigo Haidar no Conjur de 23.4.2009.

3 “De popularidade ele entende, e por isso desafiou Mendes a sair às ruas. Desde que relatou a denúncia contra os 40 do escândalo mensalão, JB ou Joca, como é conhecido no meio, está acostumado a ser aplaudido por onde passa: nas ruas, em restaurantes, e até mesmo em aviões de carreira” (idem)

4 Ibidem

5 Entrevista ao Jornal “O Globo” de 19.4.2012.

6 Folha de São Paulo, de 21.4.2012, pg. A4.

7 No artigo do CONJUR está escrito: “Primeiro ministro negro do Supremo, Joaquim Barbosa não conseguiu superar essa barreira. Ele mesmo queixou-se ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que o indicou para o posto, que se sente discriminado entre seus pares. Ouviu do presidente que deveria superar um possível "complexo de inferioridade" e se impor pela qualidade do trabalho. "Você é igual a qualquer um deles, não tem porque ficar agachado", afirmou o presidente. Lula ofereceu-se como exemplo: "Eu nem inglês sei, mas sou presidente. Eu me imponho com meu trabalho", reforçou.

8 Apud Osvaldo Trigueiro do Valle. O Supremo Tribunal Federal. Civilização Brasileira, 1976, p. 26.

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*Ovídio Rocha Barros Sandoval é advogado do escritório Advocacia Rocha Barros Sandoval & Costa, Ronaldo Marzagão e Abrahão Issa Neto Advogados Associados.






terça-feira, 24 de abril de 2012

DELAÇÃO OU TRAIÇÃO PREMIADA ?



  • DELAÇÃO OU TRAIÇÃO PREMIADA: FAVOR LEGAL MAS ANTIÉTICO

  • Delação premiada consiste na redução de pena (podendo chegar, em algumas hipóteses, até mesmo a total isenção de pena) para o delinqüente que delatar seus comparsas, concedida pelo juiz na sentença final condenatória, desde que sejam satisfeitos os requisitos que a lei estabelece. Trata-se de instituto importado de outros países, independentemente da diversidade de peculiaridades de cada ordenamento jurídico e dos fundamentos políticos que o justificam.

  • A Lei dos Crimes Hediondos (Lei n. 8.072/90), em seu art. 7º, introduziu um parágrafo (§ 4º) no art. 159 do Código Penal, cuja redação estabelecia uma minorante (causa de diminuição de pena) em favor do co-autor ou partícipe do crime de extorsão mediante seqüestro praticado por quadrilha ou bando que denunciasse o crime à autoridade, facilitando, assim, a libertação do seqüestrado. Dessa forma, premiava-se o participante delator que traísse seu comparsa com a redução de um a dois terços da pena aplicada. Por essa redação, para que fosse reconhecida a configuração da cognominada “delação premiada” era indispensável que a extorsão mediante seqüestro tivesse sido cometida por quadrilha ou bando e que qualquer de seus integrantes, denunciando o fato à autoridade, possibilitasse a libertação da vítima.

  • Posteriormente, a Lei n. 9.269/96 ampliou as possibilidades da “traição premiada” ao conferir ao § 4º a seguinte redação: “se o crime é cometido em concurso, o concorrente que o denunciar à autoridade, facilitando a libertação do seqüestrado, terá sua pena reduzida de um a dois terços”. A partir dessa nova redação, tornou-se desnecessário que o crime de extorsão tenha sido praticado por quadrilha ou bando (que exige a participação de, pelos menos, quatro pessoas), sendo suficiente que haja concurso de pes¬soas, ou seja, é suficiente que dois participantes, pelo menos, tenham concorrido para o crime, e um deles tenha delatado o fato criminoso à autoridade, possibilitando a libertação do seqüestrado. Enfim, com essa retificação legislativa de 1996 iniciou-se a proliferação da “traição bonificada”, defendida pelas autoridades repressoras como grande instrumento de combate à criminalidade organizada, ainda que, contrariando esse discurso, o último diploma legal referido tenha afastado exatamente a necessidade de qualquer envolvimento de possível organização criminosa.

  • Com efeito, a eufemisticamente denominada delação premiada, que foi inaugurada no ordenamento jurídico brasileiro com a Lei dos Crimes Hediondos (Lei n. 8.072/90, art. 8º, parágrafo único), proliferou em nossa legislação esparsa, atingindo níveis de vulgaridade; assim, passou a integrar as leis de crimes contra o sistema financeiro (art. 25, § 2º, da Lei n. 7.492/86, com redação determinada pela Lei n. 9.080/95), crimes contra o sistema tributário (art. 16, parágrafo único, da Lei n. 8.137/90), crimes praticados por organização criminosa (art. 6º da Lei n. 9.034/95), crimes de lavagem de dinheiro (art. 1º, § 5º, da Lei n. 9.613/98) e a Lei de Proteção a Vítimas e Testemunhas (art. 13 da Lei n. 9.807/99). O fundamento invocado é a confessada falência do Estado para combater a dita “criminalidade organizada”, que é mais produto da omissão dos governantes ao longo dos anos do que propriamente alguma “organização” ou “sofisticação” operacional da delinqüência massificada. Na verdade, virou moda falar em crime organizado, organização criminosa e outras expressões semelhantes, para justificar a incompetência e a omissão dos detentores do poder, nos últimos quase vinte anos, pelo menos. Chega a ser paradoxal que se insista numa propalada sofisticação da delinqüência; num país onde impera a improvisação e tudo é desorganizado, como se pode aceitar que só o crime seja organizado? Quem sabe o Poder Público, num exemplo de funcionalidade, comece combatendo o crime desorganizado (que é a criminalidade de massa e impera nas grandes cidades, impunemente), já que capitulou ante o que resolveu tachar de crime organizado ou organização criminosa; pelo menos combateria a criminalidade de massa, devolvendo a segurança à coletividade brasileira, que tem dificuldade até mesmo de transitar pelas ruas das capitais. Está-se tornando intolerável a inoperância do Estado no combate à crimina¬lidade, seja ela massificada, organizada ou desorganizada, conforme nos têm demonstrado as alarmantes estatísticas diariamente.

  • Como se tivesse descoberto uma poção mágica, o legislador contemporâneo acena com a possibilidade de premiar o traidor — atenuando a sua responsabilidade criminal — desde que delate seu comparsa, facilitando o êxito da investigação das autoridades constituídas. Com essa figura esdrúxula o legislador brasileiro possibilita premiar o “traidor”, a despeito de violar os mais sagrados princípios ético-morais que orientam a formação tradicional da família cristã; oferece-lhe vantagem legal, manipulando os parâmetros punitivos, alheio aos fundamentos do direito-dever de punir que o Estado assumiu com a coletividade.

  • Não se pode admitir, sem qualquer questionamento ético, a premiação de um delinqüente que, para obter determinada vantagem, “dedure” seu parceiro, com o qual deve ter tido, pelo menos, uma relação de confiança para empreenderem alguma atividade, no mínimo, arriscada, que é a prática de algum tipo de delinqüência. Estamos, na verdade, tentando falar da (i) morali¬dade e (in) justiça da postura assumida pelo Estado nesse tipo de pre¬miação. Qual é, afinal, o fundamento ético legitimador do oferecimento de tal premiação? Convém destacar que, para efeito da delação premiada, não se ques¬tiona a motivação do delator, sendo irrelevante que tenha sido por arrependimento, vingança, ódio, infidelidade ou apenas por uma avaliação calculista, antiética e infiel do traidor-delator. Venia concessa, será legítimo o Estado lançar mão de meios antiéticos e imorais, como estimular a deslealdade e traição entre parceiros, apostando em comportamentos dessa natureza para atingir resultados que sua incompetência não lhe permite através de meios mais ortodoxos? Certamente não é nada edificante estimular seus súditos a mentir, trair, delatar ou dedurar um companheiro movido exclusivamente pela ânsia de obter alguma vantagem pessoal, seja de que natureza for.

  • No entanto, a despeito de todo esse questionamento ético que atormenta qualquer cidadão de bem, isto é, de boa formação moral, a verdade é que a delação premiada passou a ser, via importação, um instituto adotado em nosso direito positivo. Falando em peculiaridades diversas, lembramos que nos Estados Unidos o acusado — como uma testemunha — “presta compromisso de dizer a verdade” e, não o fazendo, comete crime de perjúrio, algo inocorrente no sistema brasileiro, em que o acusado tem o direito de mentir, sem que isso lhe acarrete qualquer prejuízo, conforme lhe assegura a Constituição Federal. Essa circunstância, por si só, desvirtua completamente o instituto da delação premiada, pois, descompromissado com a verdade, e isento de qualquer prejuízo ao sacrificá-la, o beneficiário da delação dirá qualquer coisa que interesse às autoridades repressoras na tentativa de beneficiar-se com sua mentirosa delação, exatamente como tem ocorrido na praxis forensis. Essa circunstância retira eventual idoneidade que sua delação possa ter, se é que alguma delação pode ser considerada idônea.

  • Por outro lado, a legislação brasileira é omissa em disciplinar o modus operandi a ser observado na celebração desse “acordo processual”. Na realidade, a praxis tem desrecomendado não apenas o instituto da delação como também as próprias autoridades que a têm utilizado, bastando recordar, apenas para ilustrar, a hipótese do doleiro da CPI dos Correios e do ex-assessor do atual Ministro Palocci, que foram interpelados e compromissados a delatar, na calada da noite e/ou no interior das prisões, enfim, nas circunstâncias mais inóspitas possíveis, sem lhes assegurar a presença e orientação de um advogado, sem contraditório, ampla defesa e o devido processo legal.

  • A delação premiada constante do § 2º do art. 25 da Lei 7.492/86, acrescido pela Lei 9.080/95, é causa de obrigatória redução de pena (de um a dois terços), desde que o crime tenha sido cometido “em quadrilha ou em concurso de pessoas”, e o delator “através de confissão espontânea revelar à autoridade policial ou judicial toda a trama delituosa terá sua pena reduzida de um a dois terços”. De notar-se, ademais, que neste diploma legal, ao contrário de outros (Lei n. 9.269/96, que acrescentou o § 4º no art. 168 do CP), não condiciona a diminuição da pena à eficácia da “contribuição do delator”. O texto legal é taxativo ao dizer que o denunciante “terá sua pena reduzida” de um a dois terços, independente do resultado. A delação, segundo está expresso no texto legal, deve ser endereçada à autoridade policial ou judicial (Delegado de Polícia ou Juiz de Direito), estando excluído, por conseguinte, o Órgão do Ministério Público, que, nessas infrações penais, não pode ser o destinatário da questionada delação premiada.

  • A despeito dessa nossa antipatia para com o instituto, já que está aí, deveria, pelo menos, condicionar à eficácia da delação, como ocorre, por exemplo, no crime de extorsão mediante seqüestro, que está vinculada à efetiva libertação da vítima, ou seja, é indispensável a relação de causa e efeito: a libertação da vítima deve, necessariamente, decorrer da contribuição efetiva do delator. A simples vontade, ainda que acompanhada da ação efetiva do delator, é insuficiente para justificar a redução de pena. Em outros termos, é indispensável que a contribuição do delator, com sua conduta de alcagüete, seja eficaz no contexto em que se desenvolve o processo libertatório do ofendido. Como destaca Alberto Silva Franco , “a conduta do delator deve ser relevante do ponto de vista objetivo e voluntária, sob o enfoque subjetivo. Isso significa, de um lado, que cabe ao delator o fornecimento de dados concretos que, causal e finalisticamente, conduzam à libertação do seqüestrado”.

  • A delação premiada, a despeito da ausência de previsão legal expressa, deve ser voluntária, isto é, produto da livre manifestação pessoal do delator, sem sofrer qualquer tipo de pressão física, moral ou mental, representando, em outras palavras, intenção ou desejo de abandonar o empreendimento criminoso, sendo indiferentes as razões que o levam a essa decisão. Não basta que seja voluntária, é indispensável que seja espontânea, por exigência do texto legal (§ 2º), ao contrário da delação na hipótese de extorsão mediante seqüestro, em que o texto legal silencia a respeito (art. 168, § 4º): há espontaneidade quando a idéia inicial parte do próprio sujeito; há voluntariedade, por sua vez, quando a decisão não é objeto de coação moral ou física, mesmo que a idéia inicial tenha partido de outrem, como da autoridade, por exemplo, ou mesmo resultado de pedido da própria vítima. O móvel, enfim, da decisão do delator — vingança, arrependimento, inveja ou ódio — é irrelevante para efeito de fundamentar a delação premiada, desde que tenha sido espontânea, e não como a praxis forensis nos tem demonstrado.

  • A definição do quantum a reduzir deve vincular-se a critério objetivo que permita justificar a maior ou menor redução de pena dentro dos limites estabelecidos de um a dois terços. Um dos critérios sugeridos, segundo Silva Franco , é o maior ou menor tempo levado para a liberação do seqüestrado. Mas esse pode ser apenas um dos critérios a serem considerados, havendo outros mais relevantes, como, por exemplo, a maior ou menor facilidade encontrada pela autoridade para libertar a vítima e, especialmente, a maior ou menor contribuição do delator para a libertação daquela.

  • Mutatis mutandis, nos crimes financeiros, deve-se considerar o período de tempo que referidos crimes vinham sendo praticados, a quantidade de crimes perpetrados, além da continuidade delitiva etc. Mas o critério mais importante, certamente, deveria ser (mas não é, neste caso) a efetividade da contribuição trazida com a delação. Em síntese, a redução da pena aplicada será tanto maior quanto mais relevante for a contribuição da delação para a comprovação da autoria e participação do delatado: maior contribuição equivale a maior redução; menor contribuição significará menor redução, mantendo-se uma autêntica proporcionalidade nessa relação de causa e efeito.
 
Fonte: Facebook

PRESIDENTE DO STF PROPÕE APROXIMAÇÃO E INTEGRAÇÃO COM MAGISTRATURA


Diálogo

Ayres Britto propõe aproximação e integração com magistratura


O novo presidente do STF, ministro Ayres Britto, pretende abrir as duas instituições ao diálogo com a magistratura e fazer uma "gestão compartilhada", por meio da aproximação com as associações representativas da categoria.

Entre os temas que deverão ser discutidos estão a elaboração de projeto de uma nova Loman e a questão dos vencimentos dos magistrados.

Após a solenidade de posse na última quinta-feira, 19, as três entidades associativas nacionais – AMB, Ajufe e Anamatra – prestaram homenagem ao novo presidente e manifestaram seu otimismo com a proposta de "plena harmonia" manifestada por Ayres Britto. "A primeira coisa que o ministro fez, ao ser eleito presidente, foi nos reunir para conversar conosco e mostrar o caminho do diálogo, da conciliação e da Construção", afirmou o presidente da AMB, Nelson Calandra. "Esse é o perfil dele, e será muito bom para a magistratura brasileira, assim como será bom para o povo brasileiro."

Para o presidente da Ajufe, Gabriel Wedy, Ayres Britto "vai defender uma administração do Poder Judiciário democrática e aberta à sociedade".

O juiz do trabalho Renato Henry Sant’Anna, presidente da Anamatra, lembrou o prestígio que o presidente sempre conferiu ao movimento associativo e afirmou que a expectativa é de mais diálogo com a magistratura e com os demais poderes.

O primeiro sinal no sentido da ampliação do diálogo com a magistratura já foi dado com a convocação, para atuarem como juízes auxiliares da Presidência, de três ex-presidentes de associações de magistrados – Mozart Valadares, da AMB, Fernando Mattos, da Ajufe, e Luciano Athayde, da Anamatra – e a escolha do juiz de Direito Francisco Alves Júnior, ex-presidente da AMASE, para a Secretaria-Geral do Conselho Nacional de Justiça. Em diversas ocasiões, o ministro tem manifestado sua compreensão do papel do CNJ "enquanto conteúdo" e do Poder Judiciário "enquanto continente".


domingo, 22 de abril de 2012

POR UMA CAMPANHA PERMANENTE DE VALORIZAÇÃO DO MAGISTRADO



A valorização permanente do Magistrado, guardião constitucional dos direitos, garantias e liberdades públicas, é assegurar por meio do Poder Judiciário Nacional a consolidação de um Estado Democrático de Direito.

O editor !

STF JULGA COTAS RACIAIS PARA UNIVERSIDADES PÚBLICAS

STF julga cotas raciais em universidades públicas na quarta-feira 


Luiz Orlando Carneiro, Brasília 

A questão da constitucionalidade ou não do sistema de reserva de cotas para ingresso nas universidades, com base em critérios raciais ou de preferência para egressos do sistema público educacional, foi escolhida pelo novo presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Ayres Britto, como o principal tema da pauta da sessão plenária da próxima quarta-feira.
Vão começar a ser julgadas duas ações, das quais a de maior peso é a argüição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF 186), ajuizada em 2009 pelo DEM, tendo como alvo o sistema de cotas raciais da Universidade de Brasília, em vigor desde 2006. A segunda é um recurso extraordinário proposto contra as cotas para egressos do ensino público estabelecida pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. O ministro Ricardo Lewandwski é o relator das duas ações.
Cotas raciais

Quatro dos 10 ministros habilitados a votar já se manifestaram em ocasiões diversas, de uma forma ou de outra, favoráveis às polêmicas “ações afirmativas”: Joaquim Barbosa, Ayres Britto, Cármen Lúcia e Marco Aurélio.

O ministro Dias Toffoli, está impedido de participar do julgamento por que, na condição de advogado-geral da União, teve de se pronunciar oficialmente sobre a matéria — e o fez, na linha de que o acesso ao ensino “não deve se basear, exclusivamente, no critério do mérito”.
O ministro Lewandowski, em março de 2010, promoveu uma longa audiência pública sobre a questão das cotas, com inúmeras manifestações (pró e contra) referentes, sobretudo, às cotas raciais.

Já o recurso extraordinário pautado foi proposto por um estudante não aprovado em exame vestibular da UFRGS, embora tivesse alcançado pontuação maior do que alguns candidatos admitidos no mesmo curso pelo sistema de reserva de vagas destinadas a estudantes egressos do ensino público. O plenário virtual do STF reconheceu repercussão geral para o recurso. 



Nota do editor: O sistema de reserva cotas para as universidades, por si só é discriminatório, uma vez que é um dos objetivos da República Federativa do Brasil promover o bem de todos sem qualquer tipo de discriminação (CF; art. 3º, IV). Tenta-se, como sempre, tratar do efeito quando a causa reside no ensino fundamental, sendo certo que todos que chegam a prestar vestibular chegam em igualdades de condições, uns com mais outros menos conhecimento, sejam homens, mulheres, negros, amarelos, vermelhos ou brancos. O homem negro não é menos capacitado que os demais, pode sim ter sido vítima de um sistema perverso que nunca prestigiou a educação fundamental, mas isso atinge todos os menos favorecidos e não só os de cor negra. Para finalizar, há se parar com essa demagoga expressão de raça branca, negra etc. A raça é uma só, no caso, humana, a cor é que pode ser diversa.

sexta-feira, 20 de abril de 2012

ENTREVISTA: EX-PRESIDENTE DO STF LUIZ RAFAEL MAYER

TV Migalhas

Entrevista com o ex-presidente do STF Luiz Rafael Mayer











Migalhas entrevistou o ex-presidente do STF, ministro Luiz Rafael Mayer, em Recife. No alto de seus 93 anos, Mayer opina sobre o atual Supremo e comenta a posse do ministro Ayres Britto na presidência da Suprema Corte.

Veja abaixo a trajetória do ministro.
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Luiz Rafael Mayer
Filho de Marcolino Mayer de Freitas e Lydia Rafael Mayer, nasceu em Monteiro/PB, em 27/3/1919. É casado com D. Leide Diógenes Mayer, tendo o casal uma filha de nome Rafaela Diógenes Mayer.
Em Recife, fez o curso ginasial no Colégio Salesiano (1931/1936), transferindo-se, a seguir, para o Colégio Pedro Augusto onde cursou o Pré-Jurídico (1937/1938). Em 1939, ingressou na Faculdade de Direito dessa cidade, bacharelando-se em 1943.
Retornando à Paraíba, foi Prefeito do Município de Monteiro, de 1944 a 1945.De volta a Pernambuco, ingressou no MP, mediante concurso de provas realizado em 1945, para o cargo de Promotor, exercendo-o ininterruptamente de 1945 a 1955, período em que foi promovido, por merecimento, de primeira à segunda, e de segunda à terceira entrâncias, nas comarcas de Serrita, Maraial, Gameleira, Igarassu, Paulista e Recife .Em sequência à sua carreira, exerceu, também, os seguintes cargos e atividades públicas no Estado: Promotor Auxiliar da Procuradoria-Geral do Estado (1952/1954); Membro do Conselho Superior do MP/PE (1962/1964); Subprocurador-Geral de PE (final de carreira do Ministério Público, promoção por merecimento), de 1955 a 1966; Presidente da Associação do Ministério Público de Pernambuco (1951-1953); Membro da Comissão Examinadora do Concurso para Oficial Judiciário do Tribunal de Justiça de Pernambuco (1962); Conferencista no Curso de Polícia, da Secretaria de Segurança Pública do Estado de Pernambuco (outubro de 1956); Relator da Comissão nomeada pelo Governo do Estado para dar parecer sobre o Regimento de Custas do Estado (1955).No âmbito Federal, exerceu os seguintes cargos e funções: Assessor do Gabinete do Ministro da Fazenda (1963); Procurador do CADE (1964); Assessor-Chefe da Assessoria Jurídica do Ministério Extraordinário para a Coordenação dos Organismos Regionais – MECOR (1964-1967); Consultor-Jurídico do Ministério do Interior (a partir de março de 1967) e Consultor-Geral da República (abril de 1974 a dezembro de 1978).Nomeado pelo Presidente da República, General Ernesto Geisel, para exercer o cargo de Ministro do STF, por decreto de 13 de dezembro de 1978, na vaga decorrente do falecimento do Ministro José Geraldo Rodrigues de Alckmin. Tomou posse no dia 15 de dezembro de 1978.Eleito pelo STF para Juiz Substituto do TSE, exerceu o cargo de 10 de fevereiro de 1981 a 9 de novembro de 1982 e como Juiz Efetivo a partir de 10 de novembro de 1982; posteriormente, como vice-presidente até 16 de dezembro de 1984. Ascendeu à Presidência em 17 de dezembro de 1984, afastando-se em 6 de setembro de 1985.Eleito Vice-Presidente do STF a 4 de setembro de 1985, desempenhou o cargo até 9 de março de 1987. Foi eleito para a Presidência do Supremo Tribunal Federal em sessão de 10 de dezembro de 1986, exercendo-a no biênio de 10 de março de 1987 a 10 de março de 1989.Aposentou-se em 14 de março de 1989. Foi homenageado em sessão de 19 de abril, quando falaram, pelo Tribunal, o ministro Aldir Passarinho, pela PGR, o dr. José Paulo Sepúlveda Pertence e, pela OAB, o dr. Sérgio Gonzaga Dutra.Tem desempenhado, desde então, atividades de advocacia e consultoria jurídica, com inscrição principal na OAB/PE, e inscrição suplementar na Ordem dos Advogados do Brasil, Seção do DF.


MINISTRO AYRES BRITTO ASSUME A PRESIDÊNCIA DO STF E ...

19/04/2012 - 19h20

Judiciário 'tem que se impor o respeito', diz Ayres Britto

 
FELIPE SELIGMAN
DE BRASÍLIA


Ao assumir a presidência do STF (Supremo Tribunal Federal) nesta quinta-feira, o ministro Carlos Ayres Britto afirmou que os magistrados brasileiros não podem ser prepotentes e que o Judiciário, antes de impor "tem que se impor o respeito".

"Quem tem o rei na barriga um dia morre de parto, permito-me a coloquialidade do fraseado, e os juízes não estão imunizados quanto a essa providencial regra de vida em sociedade", afirmou.


Sobre a Justiça, disse: "O Poder que evita o desgoverno, o desmando e o descontrole eventual dos outros dois não pode, ele mesmo, se desgovernar, se descontrolar".

Ele também fez referência a recentes críticas, feitas até pelo seu antecessor, Cezar Peluso, sobre a tendência do Supremo de julgar de acordo com a opinião pública. Para ele, a Justiça tem que levar em conta as expectativas da sociedade, ao dizer que "juiz não é traça de processo, não é ácaro de gabinete".

"Sem fugir das provas dos autos nem se tornar refém da opinião pública, tem que levar os pertinentes dispositivos jurídicos ao cumprimento de sua mediata ou macro-função de conciliar o Direito com a vida".

Ayres Britto terá um mandato curto à frente do STF. Ele se aposentará em novembro deste ano, quando completará 70 anos. Durante o período, no entanto, existe a expectativa de que julgamentos importantes aconteçam, como o processo do mensalão, por exemplo.

O discurso em que inaugurou sua presidência foi repleto de citações poéticas e místicas. Ao lembrar-se dos pais, por exemplo, afirmou que eles são seus "ícones desta minha vida terrena e de outras que ainda terei, porquanto aprendi com eles dois que o nada não pode ser o derradeiro anfitrião do tudo".

Ele também afirmou que a consciência do juiz, que segundo ele, é fruto do "casamento entre o pensamento e o sentimento (...) corresponde àquele ponto de equilíbrio que a literatura mística chama de 'terceiro olho'. O único olho que não é visto, mas justamente o que pode ver tudo".

Sergio Lima/Folhapress
Novo presidente do STF, Ayres Britto discursa durante a sessão solene de sua posse
Novo presidente do STF, Ayres Britto discursa durante a sessão solene de sua posse


PACTO SIMBÓLICO

Aproveitando a presença da presidente da República, Dilma Rousseff, e de parlamentares, o novo presidente propôs um pacto entre os três Poderes que consistem em todos cumprirem a Constituição.

Neste momento, ele afirmou que distribuiria aos convidados,, no momento dos cumprimentos formais, quando todos fazem fila para saudar o novo presidente, exemplares atualizados da Constituição.

HINO NACIONAL

A cerimônia, que reuniu mais de duas mil pessoas, segundo assessoria de imprensa do tribunal, começou com o Hino Nacional interpretado pela cantora Daniela Mercury.
Durante a execução ela requisitou aos presentes que cantassem junto com ela.

Antes de iniciar sua apresentação, ela recitou uma curta poesia de Ayres Britto. "Não sou como camaleão que busca lençóis em plena luz do dia. Sou como pirilampo que, na mais densa noite, se anuncia."


quinta-feira, 19 de abril de 2012

RELATOR DO MENSALÃO DIZ QUE PELUSO É AMARGURADO


Relator do mensalão afirma que ministro Cezar Peluso é 'amargurado'

Joaquim Barbosa, que assume a vice-presidência do STF, também negou pretensões eleitorais

18 de abril de 2012 | 22h 25
 
Felipe Recondo, de O Estado de S. Paulo
 
BRASÍLIA - O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Joaquim Barbosa rebateu nesta quarta-feira, 18, as críticas feitas pelo presidente do tribunal, Cezar Peluso, a ele, à ministra Eliana Calmon, corregedora-nacional de Justiça, e ao futuro da Corte. "O Peluso se acha", afirmou. "Na verdade ele tem uma amargura. Em relação a mim então...", acrescentou.

Veja também:

Na entrevista, Peluso insinuou que Barbosa teria alimentado planos eleitorais por conta da relatoria do processo do mensalão. Barbosa negou que tenha algum dia falado sobre pretensões políticas com alguém. "Eles estão inventando essa história. Eu jamais falei com qualquer pessoa sobre candidatura", disse.

O ministro também saiu em defesa da corregedora-nacional de Justiça. Na sua entrevista, Peluso afirmou que Eliana Calmon não deixará nenhum legado quando terminar seu mandato no Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

Peluso e Eliana Calmon entraram em conflito ao discutir os poderes correcionais do CNJ. Peluso queria que o Conselho só abrisse investigações depois que as corregedorias dos tribunais locais investigassem magistrados suspeitos. Eliana Calmon defendia poderes mais amplos, por julgar que as corregedorias locais são, na maior parte das vezes, corporativistas.
"A Eliana ganhou tudo (no embate com Peluso). Ele não sabe perder", afirmou Barbosa. E, ao contrário da avaliação de Peluso, o relator do mensalão elogiou o trabalho da ministra e disse que ela só não fez mais porque Peluso não permitiu. "Ela fez muito, não obstante os inúmeros obstáculos que ele tentou criar", disse.

Joaquim Barbosa assume nesta quinta-feira, 19, a vice-presidência do STF. Na presidência, o ministro Carlos Ayres Britto substituirá Peluso. Inicialmente, Barbosa não quis comentar as declarações do colega. Disse que responderia apenas na sexta-feira para não estragar a cerimônia de posse. No entanto, resolveu falar e acrescentou que responderá mais enfaticamente depois da posse.

Planos políticos. Em sua entrevista, Peluso citou uma conversa com o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), para insinuar os supostos planos políticos de Eliana Calmon e Joaquim Barbosa.

"Basta lembrar de quando o ministro Joaquim Barbosa acatou o recebimento da denúncia contra os envolvidos no episódio do mensalão. Foi aplaudido em um bar do Rio de Janeiro, foi lançada a candidatura dele, e ele até gostou da ideia. Quando você se vê dentro da mídia, sendo o foco, tudo centralizado em você, tudo pode passar pela cabeça", afirmou Peluso.
"Perguntei ao presidente Sarney, ele é meu amigo, se achava que a ministra Calmon tinha intenções políticas. Ele disse: 'Se até pela cabeça do ministro Joaquim Barbosa passou isso, pode passar pela cabeça dela'. Mas ela disse que não. Mas ela se sente bem nessa postura", afirmou Peluso.

Na opinião do presidente da Corte, o ministro Joaquim Barbosa, a despeito dos problemas de saúde, cumprirá os dois anos de mandato na presidência da Corte, que assume em novembro deste ano. Mas disse não saber como o ministro se relacionará com os colegas, com advogados e com a magistratura. “Ele é uma pessoa insegura, se defende pela insegurança. Dá a impressão que de tudo aquilo que é absolutamente normal em relação a outras pessoas para ele parece ser uma tentativa de agressão. E aí ele reage violentamente”, disse.

Peluso questionou, na entrevista, a eficiência do novo sistema previdenciário do funcionalismo público, dizendo que "ninguém que tenha capacidade e decência irá procurar emprego no setor público" a partir de agora.

Também criticou a presidente Dilma Rousseff por frustrar o aumento do salário dos magistrados e servidores do Judiciário. "A Presidência descumpriu a Constituição, como também descumpriu decisões do Supremo. Mandei ofícios à presidente Dilma Rousseff citando precedentes, dizendo que o Executivo não poderia mexer na proposta orçamentária do Judiciário, que é um poder independente, quem poderia divergir era o Congresso. Ela simplesmente ignorou", disse.

Além disso, o presidente do STF criticou o senador Francisco Dornelles (PP-RJ), a quem responsabiliza pelo fracasso de sua proposta de mudança na Constituição para antecipar o trânsito em julgado de processos judiciais para o julgamento em segunda instância. Hoje, um processo só transita em julgado depois que todos os recursos possíveis sejam julgados, podendo o caso só terminar depois do julgamento pelo STF.

"A PEC só não foi votada porque o Dornelles complicou. Quem o senador Francisco Dornelles representa? Ele é do PP ou do BB - dos bancos e bancas. Estes são os grandes interessados na discussão do sistema", afirmou. "O Dornelles é senador pelo Rio de Janeiro, mas de fato representa os interesses dos bancos e representantes das grandes bancas de advocacia de Brasília. Ele travou a votação da PEC", afirmou Peluso.

FONTE: http://www.estadao.com.br/noticias/nacional,relator-do-mensalao-afirma-que-ministro-cezar-peluso-e-amargurado,862690,0.htm

quarta-feira, 18 de abril de 2012

OEA ELOGIA DECISÃO DO STF SOBRE ANENCÉFALOS

Notícias

18 abril 2012
Repercussão internacional

OEA elogia decisão do Supremo sobre abortos

A Organização dos Estados Americanos (OEA) elogiou a recente decisão do STF sobre aborto de fetos com anencefalia durante a 4ª Conferência de Estados-Partes da Comissão Interamericana de Mulheres da OEA, que acontece em Washington, nos Estados Unidos.

A secretária de Políticas para as Mulheres, Eleonora Menicucci, afirmou que o Brasil foi lembrado por ser um dos únicos países a implantar medidas de proteção recomendadas pela OEA. “Elogiaram a decisão da constituição da Lei Maria da Penha e a decisão mais recente do Supremo Tribunal Federal sobre anencefalia”, disse.

A garantia de acesso das mulheres à Justiça e a ampliação de centros de referência e casas-abrigo para mulheres vítimas de violências são os principais pontos do relatório aprovado pelos países da OEA na conferência. O documento avaliou os mecanismos adotados pelos países para implantar as recomendações da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher, conhecida como Convenção de Belém do Pará.

De acordo com a secretária nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres, Aparecida Gonçalves, a ministra solicitou à OEA que no próximo fórum sobre o tema, que ocorrerá em julho, o Brasil tenha uma mesa para discutir a questão da estrutura de Estado.

“A ministra pediu isso porque temos dez ministras, uma presidenta da República, além de várias mulheres ocupando cargos de destaque. O Brasil tem uma experiência para apresentar ao mundo”, disse Gonçalves. Com informações da Agência Brasil. 


Fonte: Revista Consultor Jurídico, 18 de abril de 2012

PRESIDENTE DO STF: PLANALTO É IMPERIAL E AUTORITÁRIO

18 abril 2012
Cezar Peluso, o juiz

Para presidente do STF, Planalto é imperial e autoritário

Cezar Peluso - SELO - 13/04/2012 [Spacca]“O Poder Executivo no Brasil não é republicano. É imperial”. Essa foi a conclusão a que chegou o presidente do Supremo Tribunal Federal, Cezar Peluso, diante do descumprimento da Constituição e das decisões do STF, pelo Palácio do Planalto, em matéria orçamentária, no ano passado. “Temos um Executivo muito autoritário”, conclui, ao lamentar a falta de independência do Congresso. O desabafo foi feito pelo ministro a este site, que hoje publica a parte final de sua entrevista.

Cezar Peluso, que se despede da Presidência do STF esta semana, revela aqui que o grande padrinho para sua nomeação como ministro, apesar do esforço do então ministro da Justiça, Márcio Thomas Bastos, foi o cardeal Dom Paulo Evaristo Arns.

A respeito de uma grande curiosidade da comunidade jurídica — se o ministro Joaquim Barbosa assumirá ou não o comando do tribunal — Peluso não duvida: “O Joaquim assume sim (...) Ele não recusará a Presidência do tribunal em hipótese alguma”. Problemas na coluna ele não tem, informa o ministro, baseado em informação do especialista Paulo Niemeyer. Peluso só receia pela capacidade do colega de bem relacionar-se com os demais ministros e com os advogados, em virtude de sua insegurança.

Neste quarto capítulo de sua entrevista, que começou a ser publicada no domingo, o ministro fala de sua preocupação com a onda populista que varre o Judiciário brasileiro e prevê que o STF tende a posicionar-se cada vez mais alinhado com a opinião pública. Ele lamenta não ter conseguido implantar um sistema de “consultas prévias” entre os ministros, para tornar as sessões mais céleres e evitar bate-bocas desnecessários, mas gaba-se de ter apaziguado a casa e reduzido, em sua gestão, as brigas que expunham o tribunal.

Sobre a corrupção, assunto de 90% das manchetes da imprensa brasileira, Cezar Peluso não esconde sua opinião: “A corrupção é um produto desta sociedade”. Ainda esta semana o site passa a publicar depoimentos e artigos sobre a passagem de Peluso pelo STF.

Leia a surpreendente entrevista do presidente do STF: 

ConJur — Qual seu legado nesses curtos dois anos de Presidência?
Cezar Peluso — Melhorei a máquina administrativa do tribunal, que é algo que não aparece, não são obras com placa de inauguração. Tomamos uma série de medidas importantíssimas na área administrativa, sobretudo na questão dos processos de repercussão geral. Esse é um instituto novo, não estava regulamentado. Essas medidas administrativas foram no sentido da ligação do Supremo com os demais tribunais. Pois essa, digamos, "ferramenta" da Súmula Vinculante tem um aspecto bastante complexo e é nesse contexto que precisamos da regulamentação, da criação de procedimentos. Fomos aos poucos regulamentando, criando mecanismos administrativos para dar feição a essas ideias. Terminamos uma rodada de reuniões nesta sexta-feira (23/3) com os presidentes e vice-presidentes e servidores dos tribunais do Brasil inteiro para afinar a sintonia com o Supremo. Existem temas repetitivos dos tribunais estaduais e locais que podem sobrestar, e que estão esperando uma uniformização por parte do STF, e isso pode criar dúvidas. Esse assunto é complexo. Iremos dar total transparência para a situação desses processos no site do STF. O cidadão poderá acessar esses processos e verificar onde estão e há quanto tempo estão, que decisões foram tomadas, o que está acontecendo. Qual o seu número e quando estão pautados para entrar em julgamento. É uma radiografia total da situação, dentro do Supremo, em relação a cada ministro e ao plenário. Além de ser transparente, para advogados em particular, mas para qualquer cidadão, esse é um instrumento de gerenciamento que irá permitir, por exemplo, saber que um processo que trata de matéria específica deu entrada cinco anos atrás e é necessário dar prioridade a ele. Antes não havia isso. Ninguém sabia. Ninguém tinha acesso aos processos em andamento do STF, nem se fez levantamento tão minucioso. O futuro presidente do STF receberá agora esse legado, terá esse material e levantamento histórico na mão e poderá estabelecer prioridades. Esse instrumento de gestão é importantíssimo. 

ConJur — Trata-se de criar um banco de dados no Supremo?
Cezar Peluso — Exato, e isso é algo que antes não havia. Hoje, praticamente não se trabalha mais com papel, tornamos praticamente definitivo o processo eletrônico. Todos os processos originados no Supremo, ações de inconstitucionalidade, habeas corpus, tudo hoje é eletrônico. Não se aceita mais nada em papel, exatamente para implantar o sistema eletrônico. Temos até cálculos, nessas informações, da economia de tempo, gerando eficácia. 

ConJur — Há pouco o STF julgou um processo de 1953.
Cezar Peluso — Sim, fui o relator. Esse processo sofreu uma série de vicissitudes fortuitas. Aconteceu praticamente tudo o que se pode imaginar. Primeiro por envolver uma transação absolutamente gigante, pois o estado de Mato Grosso doou um mundaréu de terras divididas entre várias empresas colonizadoras. Era uma extensão duas vezes maior que o estado do Sergipe. A área de terra é de 42 mil quilômetros quadrados. Distribuiu para duas dezenas de colonizadoras com a obrigação de que ocupassem o território e o desenvolvessem. As colonizadoras fracionaram esses terrenos imensos, venderam lotes, foram criadas cidades, estradas, hospitais, abrindo lavouras, enfim, estimulando o desenvolvimento da região dentro do programa Marcha para o Oeste do governo Getúlio Vargas. Essa era uma parte do programa, mas o estado do Mato Grosso se esqueceu de que a Constituição de 1946 exigia que, para realizar essas doações ou concessões de domínio, o estado deveria pedir autorização para o Senado. Eles não pediram essa autorização e em 1953, quando se iniciou a demanda, já fazia anos que aquilo estava em andamento e execução. A União resolveu entrar com uma ação para anular essas concessões e se criou um problema de grandes dimensões, pois naquela altura não eram mais apenas aquelas duas dezenas de colonizadoras. Elas haviam vendido as terras para milhares de pessoas. 

ConJur — Sobretudo a colonos vindos dos estados do Sul do país.
Cezar Peluso — Sim, era agora uma questão de propriedades particulares, as empresas vendiam os lotes em cotas, trouxeram gente do sul, o agricultor comprava o lote, às vezes não se adaptava ou não dispunha de conhecimentos técnicos para realizar exploração e acabava vendendo para terceiros. E aí temos uma sucessão de proprietários e todas essas pessoas tinham de ser citadas no processo, afinal era a propriedade deles que estava em jogo. Imagine citar esse mundo de gente envolvida, e isso foi passando pela mão de vários ministros. Quando estava mais ou menos pronto para esse processo ser julgado anos atrás, se percebeu que faltava citar outros proprietários originais, que não se sabia onde estavam. Aí retomaram as diligências para corrigir a falha. Houve uma época em que a União percebeu que esse era um processo irreversível, na verdade tratava-se da dinâmica de urbanização, colonização e ocupação do território brasileiro, uma situação irreversível. Não seria possível voltar atrás na construção de vilas, cidades. A União desistiu do processo, isso não foi homologado e, portanto, o processo continuou. Quando assumi, tomei as últimas providências para que esta Ação Civil Originária 79 fosse julgada, pois era o processo mais antigo em andamento no Supremo. Fizemos o julgamento na semana passada. Quero ir embora, mas quero resolver essas histórias. 

ConJur — Mas os ministros Lewandowski, Marco Aurélio e Ayres Brito não entenderam assim a questão, afinal, parece que não foram exatamente os pobres de Mato Grosso os principais beneficiários. Marco Aurélio disse que se estava jogando a Constituição no lixo.
Cesar Peluso — O problema é que o tribunal entendeu — e a meu ver com toda a razão, e propus isso — que desfazer hoje essa concessão, que tem mais de 60 anos, um erro do começo dos anos 1950, implicaria teoricamente destruir cidades, aeroportos, seria uma situação indescritível. Isso seria um despropósito sobre uma situação que está consolidada e que é irreversível. A terra voltaria para o estado de Mato Grosso? Hoje o estado está dividido. Acho que foi uma solução sensata do tribunal. 

ConJur — Como é ser ministro em Brasília?
Cezar Peluso — Ser ministro é muito honroso, sem dúvida. Mas é muito penoso, em termos de serviço. A gente não tem hora. Antes eu achava que trabalhava muito, de sábado, domingo. Mas aqui em Brasília o volume de trabalho não é possível explicar, só vivendo. Há 30 funcionários no meu gabinete, como se fosse uma pequena empresa. São seis assessores, analistas de diversos graus que organizam, recolhem materiais, para que eu possa estudar os processos. Quando cheguei ao STF, peguei 12 mil processos à minha espera. As sessões são às terças, quartas e quintas. Elas começam às 2h da tarde e não têm hora para terminar. 

ConJur — Como foi a convivência com personagens tão díspares como os ministros Marco Aurélio, Joaquim Barbosa ou Nelson Jobim?
Cezar Peluso — São ministros oriundos de áreas de diversas e isso é importante, eles têm ricas contribuições, com pontos de vista diferenciados. Veja o caso do ex-ministro Nelson Jobim: ter vivência da área política foi seu grande diferencial. O que alguns acham que era uma falha do Jobim na verdade era sua grande qualidade. Como ele veio da área política, havia a impressão de que lhe faltava compromisso com o Judiciário. Pelo contrário, é um homem dotado de grande espírito público. Sua atuação na Presidência do STF me surpreendeu, ele quis marcar sua administração por um avanço significativo da função do Judiciário. E justamente por não ter vícios de origem e espírito de corporação exerceu a visão global, foi aberto para compreender as preocupações das diferentes áreas. Isso foi importante e fez a diferença. Ele presidiu o tribunal numa época crucial de mudanças no Judiciário, e isso não poderia ter sido conduzido de modo melhor, pois o Jobim tinha exatamente a visão política do todo, de não ficar preso a miudezas do dia a dia do Judiciário. Ele foi capaz de chegar ao macro e perceber os pontos de estrangulamento do Judiciário. Não é que apenas a questão de que o juiz trabalhe pouco, ou porque tem pouco juiz em um determinado estado, o problema tem outros vieses. E ele fez levantamento de tudo isso. 

ConJur — Como, por exemplo, o excesso de recursos e demandas que o próprio governo cria?
Cezar Peluso — Não é só o governo. O Jobim fez um levantamento no Rio de Janeiro identificando um grupo de empresas que se serve do Judiciário para ganhar tempo em determinadas causas que sabem que terão de pagar; mas com a demora, aplicam o dinheiro e acabam lucrando. Um escândalo. Usam o Judiciário para tirar proveito, sabem que demorar a pagar é mais rentável. E isso paralisa o Judiciário. 

ConJur — Como é ver o sistema do Judiciário e da Justiça desde o centro do país? O que mudou em sua percepção?
Cezar Peluso — Sou muito ligado à Justiça estadual, que é a Justiça mais próxima do povo, do cidadão, sem dúvida. Preocupo-me com ela e suas reivindicações. Mas também sou um crítico da Justiça estadual, conheço sua realidade, sei os pontos que deveriam ser mudados. Mas daqui de Brasília, a percepção muda ao ver que as coisas são mais graves do que se percebia quando estava em São Paulo. Há um problema na Justiça de São Paulo, gravíssimo, que é a falta de recursos. Agora, tirando isso, a Justiça de São Paulo é modelar. Mas no âmbito nacional, há problemas graves, sobretudo nas regiões mais longínquas. Uma das coisas que me convenceram a aderir à proposta do Conselho Nacional da Justiça no período de sua implantação foi haver convivido mais de perto com esses sérios problemas da Justiça no Brasil como um todo. 

ConJur — E havia a discrepância gritante em termos de salário.
ConJur — São Paulo é o estado que pior paga a seus juízes. E há outra distorção: o número de entrâncias, de degraus, é enorme. Na Justiça Federal são duas ou três. Então, há uma diferença maior de vencimentos entre os diferentes níveis. Tive alunos, na época em que lecionava na PUC-SP, que passaram nos dois concursos, para juiz estadual e federal, e disseram: “professor, não tem jeito, gosto muito da Justiça estadual, mas não dá”. E essa situação não depende do Judiciário, mas do Executivo estadual, que precisa ter maior sensibilidade para isso. No longo prazo, o Executivo degrada a qualidade dos quadros funcionais da magistratura do estado. 

ConJur — Alguns pesquisadores dizem que não é o CNJ que resolverá o problema do Judiciário, mas sim uma injeção maciça de dinheiro para informatizar, adequar, melhorar as instalações.
Cezar Peluso — Eu mesmo fiz críticas como essa. Essa censura que me fazem, dizendo que mudei de ponto de vista, é injusta. Sempre fui claro. Examinando a crise do Judiciário, achava que a criação do Conselho era um instrumento válido, mas não o principal para resolvê-la. Os problemas macro do Judiciário são dois: o primeiro é a demora excessiva. Embora haja demora no mundo inteiro, aqui ela não é razoável. O segundo é a grande massa da população sem acesso ao Judiciário. Os marginalizados, os excluídos da cidadania, não sabem de seus direitos. E mesmo que soubessem, não têm instrumentos para viabilizar o acesso ao Judiciário. Pois o sujeito que mora na roça, ou na periferia, não tem acesso a um advogado, que mora ou atua no centro da cidade. A organização estatal de assistência judiciária é precária. Alguns estados ainda não se moveram para efetivar as defensorias públicas. A Justiça funciona basicamente para a classe média e para um grupo de empresas. Porque até as grandes empresas já não vão ao Judiciário, só em alguns casos. Preferem arbitragens em escritório de advocacia. Essa é a grande questão da Justiça, ser uma Justiça para todos. Mas, repito, não se pode falar em reforma séria do Judiciário sem tocar no orçamento. São Paulo, que do ponto de vista econômico é o estado mais forte, só agora está começa a informatizar seu tribunal. Não por negligência da direção do tribunal, mas por absoluta falta de dinheiro. 

ConJur — Qual foi o momento de mais felicidade como ministro do STF?
Cezar Peluso — Fora o momento da posse, nada de excepcional. Acho que nós julgamos assuntos muito importantes, alguns julgados rapidamente atendendo as demandas da sociedade, o Supremo respondeu bem a essa demandas, sobre a união homoafetiva, a diversidade de opinião, a lei de imprensa, tivemos 15 ou 20 decisões de grande repercussão social. O que me deixou de consciência tranquila é que, de certo modo, o tribunal se apaziguou um pouco durante minha gestão. Sabemos dos diálogos exacerbados entre os ministros, que aconteceram no passado. Durante minha gestão isso não aconteceu em nenhum momento. Tentei conduzir as reuniões do Plenário de uma maneira tranquila, de alto nível. Não houve nenhum episódio que relembrasse os atritos anteriores. Acho que minha moderação na direção do Supremo ajudou a refrear um pouco o entusiasmo ou o estado de ânimo, permitindo que o tribunal decidisse sem se expor. As brigas anteriores expunham muito o tribunal. Além da parte administrativa, que a gente fala que é a parte subterrânea, que não se vê, está tudo organizado. A Central do Cidadão é algo importante e eficiente, atende qualquer demanda, as coisas andam rapidamente. Do ponto de vista interno do funcionamento do tribunal, demos passos importantes. Claro que alguns problemas ficam fora do nosso controle. Como presidente do Supremo, não tenho tanto poder assim. E defendi as prerrogativas do Supremo naquele confronto com a Presidência da República na questão do orçamento. A Presidência descumpriu a Constituição, como também descumpriu decisões do Supremo. Mandei ofícios à presidente Dilma Rousseff citando precedentes, dizendo que o Executivo não poderia mexer na proposta orçamentária do Judiciário, que é um poder independente, quem poderia divergir era o Congresso. Ela simplesmente ignorou. Aí fomos obrigados a tomar atitudes públicas de defesa, o que gerou aquela confusão toda no ano retrasado. 

ConJur — E qual foi a conclusão?
Cezar Peluso — Isso foi para o Congresso e ele resolveu ignorar o Judiciário, pois o governo tem a máquina da maioria. 

ConJur — Esse parece ser o problema maior do sistema brasileiro, manter a maioria.
Cezar Peluso — E o Congresso ensaiou tomar atitude de certa independência. Vários líderes, tanto do Senado como da Câmara, vieram dizer que iriam aprovar nosso orçamento contra a vontade do Palácio do Planalto. Na época, o Arlindo Chinaglia [deputado federal do PT-SP], que era o relator do orçamento, esteve comigo, ele não falou diretamente, mas deu a entender que tomaria uma atitude de independência. Mas o poder de fogo do Executivo é grande, eles acabaram não tomando atitude, curvando-se ao "toma lá, dá cá". Temos um Executivo muito autoritário. É um Executivo imperial, não é um executivo republicano. 

ConJur — Seria resultado de uma Constituição que começou inspirada no Parlamentarismo e se transformou em Presidencialista, até por pressão do Executivo, na época, o governo Sarney?
Cezar Peluso — É uma Constituição inspirada em alguns princípios parlamentaristas, mas aplicados num regime presidencialista e com caráter autoritário. Não dá muito certo, não. Mas me foi perguntado o que me deixou feliz, sem me arguir sobre minhas frustrações. E uma delas foi não ter conseguido implantar um sistema de conversas e consultas prévias antes dos grandes julgamentos. Há um projeto de emenda regimental que não quis apresentar ainda, que propõe fazer reuniões prévias e reservadas para discutir um assunto antes do julgamento, para evitar ficar “batendo boca” durante a sessão. Isso seria fundamental. É trocar ideias, não é querer fazer conchavos. É expor a opinião, uma discussão preparatória para depois cada um tomar a decisão em reservado. Não fazemos isso e vamos para o plenário e aquilo vira aquele “furdunço”. Muitas vezes até se percebe que o sujeito esta formando um raciocínio durante a discussão. 

ConJur — No começo de sua administração, o senhor não compartilhava seus projetos, como a PEC dos Recursos.
Cezar Peluso — É uma opinião minha, e a considero acertada. A reação contra a PEC não é uma reação de lógica jurídica ou socioeconômica, é uma reação de certo viés corporativista por parte de advogados beneficiários da indústria dos recursos, da protelação e de ciúme intelectual. A causa principal dos atrasos dos processos no Brasil é a multiplicidade de recursos e, especificamente, o nosso sistema de quatro instâncias. A PEC só não foi votada porque o Dornelles complicou. Quem o senador Francisco Dornelles representa? Ele é do PP [Partido Progressista] ou do BB, dos bancos e bancas? Estes são os grandes interessados na discussão do sistema. O Dornelles é senador pelo Rio de Janeiro, mas de fato representa os interesses dos bancos e representantes das grandes bancas de advocacias de Brasília. Ele travou a votação da PEC. Mas todo mundo está insistindo com ele para acabar logo e Marta Suplicy diz que irá votar agora na Comissão de Constituição e Justiça. Vai fazer audiência e colocará para discutir. A maioria do Senado é favorável à PEC 15. Não propus em nome do Supremo, dei uma ideia e o senador do Espírito Santo Ricardo Ferraço (PMDB) foi lá e pegou a minha ideia, nem me perguntou ou consultou, apresentou a PEC e veio trazer a cópia. Eu disse: “Mas não é isso o que eu tinha em mente”. Aí o senador Aloysio Nunes Ferreira, que é o relator, restabeleceu o meu pensamento. Aí o substitutivo do Aloysio é exatamente o que eu pensava. 

ConJur — Num congresso coalhado de advogados o senhor acha que passa?
Cezar Peluso — Passa, passa, porque a lógica é irrefutável. Na maior parte dos países são duas instâncias, excepcionalmente na Comunidade Europeia, em que o conselho recomenda que “se estabeleça uma terceira instância só em casos excepcionais”. Na Europa, a maioria é duas. 

ConJur — O que o senhor fará depois de aposentado?
Cezar Peluso — Vou dar uma resposta absolutamente sincera: não sei ainda. Não estou preocupado. Estou absolutamente preparado. 

ConJur — Se a PEC dos 75 anos passasse amanhã, o senhor ficaria?
Cezar Peluso — Não sei mais. Antes eu ficaria, agora não sei mais. A minha cabeça está pronta para ir embora. 

ConJur — O TJ do Rio tem um serviço de acompanhamento psicológico para juízes
que se aposentam.
Cezar Peluso — [risos]Tivemos um caso aqui em São Paulo, o do Flávio Torres, um desembargador famoso, não tinha filho, ele não fazia outra coisa na vida a não ser viver para o tribunal. Se aposentou e, dias depois, teve um enfarte fulminante. O desembargador Yussef Said Cahali teve um derrame. Ele perdeu ao mesmo tempo o cargo de desembargador e a cadeira na faculdade, por haver chegado à idade limite. 

ConJur — O senhor se preocupa com o futuro do STF?
Cezar Peluso — Irei sair do tribunal daqui a pouco e me preocupo sim com a sucessão. Outro dia, alguém falava sobre o sistema de indicação. Mas não existe isso de "sistema melhor de indicação". A qualificação é importante, mas algumas indicações podem ser preocupantes em relação ao que irá acontecer. 

ConJur — Com as oscilações de saúde, o ministro Joaquim Barbosa assume após o ministro Ayres Brito?
Cezar Peluso — O Joaquim assume, sim. Viram como ele está comparecendo ao Plenário? Teve uma melhora grande, antes quase não aparecia. Agora, comparece a todas as sessões. Ele não recusará essa Presidência em circunstância alguma, pode ficar tranquilo. Tem um temperamento difícil, não sei como irá conviver, primeiro com os colegas. Não sei como irá reagir com os advogados, pois tem um histórico desde o episódio com o Maurício Correia [ministro aposentado do Supremo. Em 2006, Joaquim Barbosa, no Plenário, sugeriu que o então presidente do STF fazia tráfico de influência]. Também não sei como irá se relacionar com a magistratura como um todo. Isso já é especular. Ele é uma pessoa insegura, se defende pela insegurança. Dá a impressão que de tudo aquilo que é absolutamente normal em relação a outras pessoas, para ele, parece ser uma tentativa de agressão. E aí ele reage violentamente. 

ConJur — A insegurança para o debate o faz resistir aos advogados?
Cezar Peluso — A impressão que tenho é de que ele tem medo de ser qualificado como arrogante. Tem receio de ser qualificado como alguém que foi para o Supremo não pelos méritos, que ele tem, mas pela cor. 

ConJur — Mas ele tem problema com a coluna?
Cezar Peluso — A coluna dele é perfeita, não tem nada de errado, ele tem problema nos quadris. O especialista Paulo Niemeyer no Rio diz que ele não tem problema na coluna, tem problema no quadril. Mas o certo é que alguma coisa ele tem, mesmo. Ter de ficar de pé, ficar tanto tempo de licença... 

ConJur — E quanto aos demais ministros?
Cezar Peluso — O Gilmar Mendes tem ambições acadêmicas, acho que não irá ficar muito tempo no tribunal. Talvez ele se decepcione com o andamento da Corte, mas são conjecturas. Ele é o último indicado pelo Fernando Henrique Cardoso. O ministro Celso de Melo está ameaçando sair faz tempo. Não sei até quando fica. 

ConJur — Acha que o Supremo irá encolher em importância?
Cezar Peluso — Não sei o que irá acontecer, mas é preocupante. Há uma tendência dentro da corte em se alinhar com a opinião pública. Dependendo dos novos componentes. 

ConJur — O clamor social é o clamor da mídia. A sociedade quer linchamento. A sociedade não é contra a corrupção, ela é contra a corrupção do outro.
Cezar Peluso — A corrupção é um produto desta sociedade. O que me chamou a atenção e me fez entender uma série de coisas, foi quando li uma pesquisa realizada há uns três ou quatro anos, uma consulta feita entre jovens de 16 a 21 anos. Uma das perguntas era: você, para subir na vida, ser bem sucedido economicamente, seria capaz de fazer qualquer coisa do ponto de vista ético? E esses jovens responderam que sim. Uma sociedade com uma juventude que não vê limites éticos nem morais para ser bem sucedida economicamente só pode resultar em uma sociedade de corruptos. Os corruptos não nascem por geração espontânea ou de ETs e discos voadores. 

ConJur — O repórter da TV Globo se fez passar, com anuência do diretor de um hospital do Rio de Janeiro, por chefe de compras da instituição, entrevistando várias pessoas. E o Código de Ética do Jornalista Brasileiro diz que o repórter não pode utilizar o recurso da falsa identidade.
Cezar Peluso — Na área penal, chama-se de flagrante preparado. O sujeito prepara um flagrante para induzir a pessoa a cometer o crime. Não é crime. O que notei nessa crise toda é que a Folha de S.Paulo, e isso me espantou muito, quando repercutia uma série de queixas do conselheiro Marcelo Nobre sobre o CNJ, não identificava a fonte. Isso contrariava os princípios da Folha. Ou o repórter sabe por ciência própria ou ele tem de dizer qual é a fonte. O repórter escreveu: “conselheiros falavam”. Quem? Nunca citaram os nomes. 

ConJur — O senhor está em excelente forma física.
Cezar Peluso — Jogo tênis e faço musculação. 

ConJur — Com quem do Supremo já jogou tênis?
Cezar Peluso — Ninguém de lá sabe jogar tênis. Então, contrato um professor e em todos os dias e horários marcados ele esta lá. Quando os amigos combinam de ir jogar, geralmente o outro não vai e não dá para praticar sozinho. Então acho mais prático contratar o professor. 

Momentos decisivos, a nomeação para o STF A esposa do presidente, Lucia de Toledo Piza Peluso, chega em casa acompanhada de uma amiga e participa por alguns momentos da conversa. Comenta-se sobre uma eventual aprovação da PEC dos 75 anos [Proposta de Emenda à Constituição 11/2005, que altera de 70 para 75 anos o limite de idade para a aposentadoria compulsória de servidor público], um projeto irrefutável, pois quando esse teto foi estabelecido, há mais de 50 anos, a expectativa de vida dos brasileiros era de 55 anos. Hoje ela está em 73,5 anos. A aposentadoria compulsória de servidores públicos dispensa uma mão de obra qualificada. E levando em conta que só fica na ativa quem quiser, ela não provocará mal a ninguém. 

ConJur — A senhora acha que, se fosse aprovada a PEC dos 75 anos, o ministro Peluso deveria continuar no STF?
Lucia Peluso — Tem tanta coisa que ele poderia fazer! Acho que para o Supremo será uma perda. 

ConJur — Como descreve a carreira dele?
Lucia Peluso — Foi uma carreira construída passo a passo. Ele se fez sozinho, um homem determinado que desde a época de estudante sempre foi vocacionado. Ele já estudava, fazia faculdade pensando em ser juiz. Ele se preparou arduamente, varava noites, madrugadas estudando. Eu o conheci na faculdade. [Peluso intervém: "Lúcia foi minha caloura, quase dei trote nela" (risos)]. Foi com empenho e dedicação que ele construiu a carreira. Fez isso com sacrifico pessoal e familiar. Fez concurso logo que atingiu a idade exigida na época, pouco após sair da faculdade. Entrou no primeiro concurso de que participou e foi para o interior, com filho pequeno, com todas as dificuldades que havia naquela época. São Sebastião não tinha estrada. Em dia de chuva, era aquele lamaçal. Mas ele nunca desanimou. E depois fomos para a divisa com Minas, Igarapava, terra vermelha roxa, não tinha nada, era quase uma cidade fantasma. Foi presidente do orfanato. Era uma comarca que ninguém queria. Mas ele deixou a sua marca. Depois, veio para São Paulo. Ele construiu a carreira sozinho, nunca teve ninguém para ajudar. Não teve parente ou um figurão. 

ConJur — A senhora já presenciou alguma grosseria por causa de voto ou decisão dele?
Lucia Peluso — A gente escuta comentários de pessoas, não de amigos. Uma vez houve uma votação do Supremo tendo como tema uma causa que era do interesse do governo. E eles decidiram a favor, pois era a decisão que concretamente o Cezar achava que deveria tomar. Estávamos voltando de Brasília para passar o final de semana em casa, e já no ônibus do aeroporto a caminho do avião, ele estava em pé e segurava a minha mão, veio uma pessoa e comentou com o acompanhante “Viu a decisão do Supremo hoje?”. E nós dois com cara de paisagem. O outro retrucou: “O que você queria? São todos ministros comprados pelo Lula” [risos]. Não fomos reconhecidos, mantivemos a mesma cara de paisagem. 

ConJur — Ministro, como o senhor vê isso, no seu caso: o presidente Luiz Inácio Lula da Silva ter nomeado uma pessoa do lado oposto de seu arco ideológico?
Cezar Peluso — Isso que irei dizer é uma interpretação puramente subjetiva de minha parte. No começo, o Marcio Thomaz Bastos [advogado e ex-ministro da Justiça] estava bancando o meu nome com certa força, pois ele me conhecia de longa data. Mas houve um momento em que até ele achou que a minha candidatura tinha ido por água abaixo. Acho, e que isso fique claro, que o Dom Paulo Evaristo Arns escreveu uma carta que foi decisiva. Houve a carta. Foi um apoio importante, pois ele me conhecia, havíamos participado de vários encontros, no grupo de juízes na época do regime autoritário. Como já contei, nos reuníamos periodicamente com várias pessoas, leigas e padres também, para discutirmos a realidade brasileira. Várias vezes levei o Dom Paulo para casa depois dessas reuniões, e íamos discutindo assuntos daquele momento. Mas concorria comigo para a vaga do STF um juiz ligado à Associação dos Juízes pela Democracia [o juiz, hoje desembargador Dyrceu Aguiar Dias Cintra Jr.], que tinha apoio de toda a esquerda, até do MST, ele era ligado ao PT. O Lula ficou sensibilizado com isso. O que eles fizeram? Um amigo ou amiga desse juiz conseguiu uma carta de apoio do cardeal endereçada ao Lula. 

ConJur — O que deve ter sensibilizado ainda mais.
Cezar Peluso — Então, o desembargador [Antonio Carlos] Malheiros soube disso e veio me contar. Segundo seu entender, o cardeal, como homem bondoso, endereçou a carta, pois não iria falar o contrário e nem falar mal de ninguém. Então, o Malheiros sugeriu que eu contasse essa história para um padre conhecido seu: “O cardeal precisa tomar uma atitude e ele não quer tomar. Ele disse que não queria se envolver mais nessa história”. Tive o encontro com esse padre, conversamos. E esse padre foi até o cardeal, segundo o Malheiros me contou depois: “Vossa eminência sempre falou que devemos ser fiéis à verdade, e o senhor se colocou em uma situação ambígua. Então, é preciso dizer ao presidente Lula e deixar claro que o seu candidato é o desembargador Peluso”. O Dom Paulo Evaristo Arns então escreveu essa segunda carta, que não cheguei a ler. Mas fiquei três meses em uma tensão tremenda, não conseguia trabalhar, o dia inteiro recebia telefonemas: “Está nomeado”, “Não está nomeado”, “Fulano está apoiando”. Foi um inferno! 

ConJur — Qual o momento mais constrangedor como presidente do STF?
Cezar Peluso — [Longa pausa.] Passei por um momento muito difícil e constrangedor com a morte da magistrada do Rio de Janeiro [juíza da 4ª Vara Criminal de São Gonçalo, Patrícia Acioli]. Considero um momento grave na função de presidente do Supremo e do CNJ. 

ConJur — E qual foi o momento de pura felicidade, em que se sentiu em estado de graça?
Cezar Peluso — Quando tomei posse na Presidência e revi pessoas que jamais pensei que iria rever na vida. Compareceu o meu diretor do Colégio Estadual Arnolfo de Azevedo, de Lorena. É um homem muito inteligente, e avançadíssimo no seu tempo. Ele era socialista naquela época. Esteve lá para me cumprimentar e me enviou uma carta, relembrando meu tempo de aluno. Vieram uma professora de Portugal, que é muito amiga, dois representantes da Corte portuguesa. Família, amigos, alunos... Foi um momento de pura emoção, um momento irrepetível.

Carlos Costa é jornalista, professor da Faculdade Cásper Líbero e editor da revista diálogos & debates.

FONTE: Revista Consultor Jurídico, 18 de abril de 2012