"A regra da igualdade não consiste senão em quinhoar desigualmente aos desiguais, na medida em que se desigualam. Nesta desigualdade social, proporcionada à desigualdade natural, é que se acha a verdadeira lei da igualdade... Tratar com desigualdade a iguais, ou a desiguais com igualdade, seria desigualdade flagrante, e não igualdade real." Rui Barbosa



sexta-feira, 4 de maio de 2012

INVESTIGAÇÃO, AÇÃO PENAL ORIGINÁRIA E O STF



Quartas com Lei e com Direito – A investigação, a ação penal originária e o Supremo Tribunal Federal - 01 de maio - 2012

Se há algo já assentado em relação às relevantes distinções quanto aos diferentes modelos processuais e o papel do juiz em cada um é exatamente o afastamento dele (juiz) da fase de investigação nos sistemas acusatórios.

Dito isso, vamos ao ponto: a fase de investigação tem e há de ter como atores principais, no que respeita à condução de seus rumos, a polícia judiciária e o Ministério Público. A primeira por que detém a função de investigação já definida na Constituição e o segundo – o parquet – pelas mesmas razões, acrescidas de sua legitimidade ativa para a ação penal pública, o que lhe confere, pois capacidade postulatória.

Nosso foco hoje é apontar o equívoco injustificável na jurisprudência atual do Supremo Tribunal Federal, no que respeita a uma suposta (mas inexistente) exigência de autorização daquela Corte para a instauração de investigação contra pessoas ocupantes de foro privativo por prerrogativa de função. Não se pode afirmar com segurança, mas parece que tudo teria se iniciado a partir do julgamento da PET 3825, na QO-MT e no Inq 2411 – QO-M, Relator para o acórdão Ministro Gilmar Mendes, em outubro de 2007.

Equívoco, de início, porque o que parece ter sido ali decidido (e com doutos votos vencidos) foi a impossibilidade de indiciamento dos investigados com foro privativo pela polícia e a necessidade de provocação pelo PGR. Afirmou-se, ainda, a atuação de supervisão do Tribunal, via Relator, da tramitação da investigação. Nada, porém, autorizaria o que se seguiu, no sentido de ter o Procurador-Geral da República que solicitar autorização para a investigação.

Em segundo lugar, porque está na contra-mão dos esforços para a construção de um modelo de feições acusatórias, ao submeter ao Judiciário, antes mesmo da fase de investigação, juízo acerca da pertinência indiciária ou típica de fatos tidos por delituosos pelos órgãos constitucionalmente instituídos para a persecução penal.

Ao que parece, pretende-se afirmar que a Lei 8.038/90 e o Regimento Interno do STF estabeleceriam procedimento diverso do CPP. As aludidas normas, contudo, não confortam tal pretensão; ao contrário, rejeitam-na claramente. O art. 2º da Lei 8.038/90, aliás, fala que o Relator será o juiz da instrução e que terá as atribuições que a legislação processual confere aos juízes singulares!!! E nada há no RI do STF – art. 230 ao art. 234 – que exija a autorização do Relator para o início de investigação contra detentor de foro privativo naquela Corte. O Procurador-Geral da República é o órgão constitucionalmente legitimado a promover a responsabilidade penal daqueles que ali tem foro, o que, evidentemente, inclui o juízo acerca da necessidade de investigação.

Não recusamos, por outro lado, a possibilidade de o STF (e qualquer outro Tribunal) conceder, eventualmente, habeas corpus de ofício, a fim de se trancar investigação em curso, quando presente qualquer razão de mérito que independa de prova (atipicidade manifesta, prova cabal de excludentes de ilicitude e culpabilidade, extinção da punibilidade). Certamente! O juiz e os tribunais, na fase de investigação, são sempre juízes das garantias individuais. Do mesmo modo que a eles cabe avaliar e autorizar eventual quebra das inviolabilidades pessoais (sigilo telefônico, busca e apreensão etc), mediante provocação, poderiam também abortar a marcha de investigações manifestamente inviáveis e/ou abusivas. Mas não emitir autorização para a investigação!

Por fim, há algo ainda mais relevante, quanto às consequências da orientação: se nada há no RI do STF (e nem poderia haver!) que autorize o entendimento ali professado (da exigência de autorização do Relator para abertura de IP), e tampouco na Lei 8.038/90 - que seria especial em relação ao CPP - porque não se exige ainda na jurisprudência a mesma autorização judicial para todas as instâncias???

Andou mal a Suprema Corte sobre o tema. Tal como está, então, o foro privativo nos demais tribunais é prerrogativa de função, enquanto ali, afirma-se também privilégio de instância.

Visite nosso site, para atualizações/erratas e outras publicações
www.eugeniopacelli.com.br
eugeniopacelli.com.br
 
 
Nota à pedido do autor:  Deixa-se claro que se trata de análise teórica do tema, sem qualquer referência a caso concreto em andamento.
 
 
Fonte: Facebook

Nenhum comentário:

Postar um comentário